sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Next step: Basel

Basilea
Daí que eu juro que havia prometido pra mim mesmo que nesse ano que se aproxima eu sossegaria e ficaria na minha. 2013 foi um grande ano para mim e dona Lyanna. Rodamos a França em janeiro, voltamos, gravamos coisas, nos apresentamos e estudamos bastante. Além disso, vocês sabe como é, né, a pessoa fez letras e é músico e mimimi. Ela tem que sossegar em algum momento. Ou não. XD

Sabe quando você conhece alguém aleatoriamente? E sabe quando esse alguém é um mineiro muito gente fina, que é músico e tal (e né, dois músicos quando se juntam não sabem ficar quietos, e o papo rola solto). Pois bem:

Conheci um rapaz muito legal no carnaval, assim que cheguei de viagem. Conversa vai, conversa vem, em pleno carnaval, o primeiro PAM da história: ele trabalha com música antiga, e leciona canto numa escola de música antiga (duh) na Suíça. Estava no Brasil de férias curtindo um pouco o carnaval e revendo a família. Mais conversa vai e mais conversa vem e PAM [2]: descobrimos que ele é colega de uma vielista que admiro muito e que trabalha com música barroca na mesma escola que ele: Tobie Miller. Dude, Tobie Miller, que para quem não sabe é uma verdadeira diva eterna assumidade/virtuosa da viela de roda barroca. Eu já via coisas sobre ela antes mesmo de comprar a minha viela... Sua história é interessante não só porque ela é uma das poucas vielistas que chegaram ao instrumento através de uma formação sólida em música antiga (e não através da música folk) mas porque toda sua formação é erudita e vem de família - Tobie tocava violino também, e hoje se divide entre a viela, a flauta doce e o canto, tocando em diferentes ensembles e trabalhando com pessoas do calibre de Matthias Loibner, fora seu trabalho como professora dentro e fora da Schola Cantorum Balisiensis.

Pronto, bastou esse meu rápido papo de algumas horas com o Victor para mais um passo ser dado na trajetória desse ser estranho que vos escreve. Uma plethora (finalmente uma desculpa pra usar essa palavra rsrsrsrssssss) de nights a serem trocadas por noites em claro assistindo séries dentre as quais estão Downton Abbey (não quero falar sobre isso por motivos de: estupros) , Homeland, The Good Wife, The Walking Dead (aliás deixo aqui meu CONGRATU-FUCKIN'-LATIONS pro Rick babacão-fdp que expulsou a Carol mas fez pior que ela depois no mid-season finale, idiota imbecil parei) para que mais dinheiros fossem guardados para que eu pudesse cogitar outra viagem; dessa vez para Basileia, cidade aleatória e linda que faz fronteira com França e Alemanha, e para onde estarei viajando em breve.

Basi o quê? - Léia.
Alguns meses e pouquíssimas mensagens depois, voilà, estaria por vir mais um mês lá do outro lado do atlântico (e apesar de isso ser o máximo, eu sempre fico tenso por motivos de: aviões) girando a manivela e tentando aprender o máximo possível. O porém dessa vez, meus amigos, é que isso vai rolar num ambiente mais erudito e, quase consequentemente, mais rigoroso. UÉ HENRIQUE MEIRELLES, MAS VOCÊ NÃO FUGIU DO MUNDO ERUDITO? -S. VDD.

                                                           Mas quem resiste a isso?! 

Eu vivo mencionando a dicotomia chata e inconveniente que existe entre o mundo da música folk/popular e o mundo da música erudita, que sempre me pesou nas costas quando eu estudava violino clássico. Toda aquela atmosfera tensa de uma sala de concerto, todo aquele ar pomposo de superioridade e pedantismo, fora as caras e bocas e poses... Enfim, tudo aquilo que ia contra a minha ideia de música/arte/prazer sempre me incomodou, e crescer musicalmente na atmosfera folk tem sido uma experiência muito interessante porque pude ver que o problema nunca é a atmosfera musical em si, mas sim as pessoas. O que quero dizer é que no fim das contas acabei me deparando com esses mesmos drawbacks também no meu mundinho. Para variar, perdi o fio da meada, vamos lá:

Acho que devemos ter em mente que toda essa aura de realeza que emana do mundo erudito tem uma razão de ser. Suas peças podem ser incrivelmente mais complexas que a maioria das boas e velhas tunes, de forma geral, já que obviamente sabemos que tudo depende do músico que estiver executando a música. Relativismos à parte, uma coisa é certa: os meus anos de violino clássico em escolas e conservatórios fazem com que até hoje meus dedos atinjam os lugares que quero com mais precisão, e as horas consagradas a peças e escalas e mudanças de posição me renderam uma certa fluência que me é muito útil, de fomo que eu só tenho a agradecer aos meus últimos professores - ambos apaixonados pelo período barroco -  que de fato me fizeram crescer mais que meus professores desse lado da moeda.


A ironia por trás desse post se dá quando o foco cai sobre a viela de roda e vemos que apesar de carregar uma história muito, mas muito mais longa que a do violino que conhecemos hoje, seu quase desfecho foi imensuravelmente mais trágico. Enquanto o violino seguia seu caminho para o topo da "cadeia alimentar" coroando orquestras e arrastando multidões para as salas de concerto, a pobre viela, apesar de seu rápido boom no século XVIII, ficou com os mendigos cegos da Europa risos teve um quase-fim um pouco menos feliz.

Analisando a sua história a gente pensaria que a tradição que o instrumento traz seria muito mais pesada, mas a verdade é bem outra. Tudo parece mais leve quando falamos de vielas e vielistas, e eu pude ouvir mais de uma vez um dos ícones da "França vielística" mandando que eu ignorasse a tradição e fizesse o que eu queria fazer, porque música é prazer, é liberdade e eu nada teria a ver com uma tradição que só serviria de amarras. Bom, que fique claro que quando ele dizia "tradição", ele se referia à tradição folclórica da região central da França. De fato entendo que há uma linguagem a ser seguida em cada estilo e eu respeito isso, mas no fim acredito que um sotaque nativo não te garante boa comunicação, e tenho isso como fato. Por isso guardei o conselho do Laurent no coração com muito carinho e tento lembrar dele sempre que me dou conta do quão irlandês ou caipira eu ainda não soo. 

Por outro lado, justamente por não negar minhas origens e por reconhecer a importância que o mundo erudito teve em mim, decidi mudar um pouco o rumo da minha trajetória vielística e encarar essa tortura (rsssss) que vai ser estudar ao lado da Tobie e sua bagagem erutida em Basileia. Se houve um período em que a viela de roda ganhou status de um instrumento legítimo, esse período foi o Barroco. Inúmeros compositores (dentre os quais se encontram Mozart e Vivaldi, ok?) escreveram para a viela, métodos foram criados e um verdadeiro boom de luthiers veio à tona nas cortes de Louis XIV e Louis XV, graças a utópica ideia de volta aos costumes campestres e à simplicidade dos campos. Claro que depois da revolução tudo isso mudou e a viela foi mais uma vez deixada aos campos, mas o repertório daquela época ficou; e aquilo que foi construído em volta do instrumento permaneceu para nós e com certeza é uma grande fonte de técnica e diferentes visões e abordagens - principalmente em relação a maldita mão direita, que na música barroca não para quieta risos.

Bom, fato é que nunca estive mais animado. Primeiro porque a Suíça é um país sobre o qual eu mal pensei na minha vida - nunca me chamou muito a atenção. E segundo porque a cidade em questão - Basileia, Basel, Bâle - é um lugar sobre o qual jamais ouvi falar e tem um nome super sonoro (/random).

Mais uma vez a viela vai me levar a outro mundo, e mais uma vez aquele friozinho na barriga vem chegando e aumentando a cada dia.

Que venha a Basileia e tudo o que ela pude me oferecer.
Feliz 2014 a todos nós!

Vielisticamente,

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